Estamos sempre contactáveis e podemos falar com toda a gente
de várias formas. Temos centenas de amigos. Mas na verdade estamos sozinhos, ou
melhor, somos nós e o computador, o tablet ou telemóvel. Nós e coisas. Coisas
não são gente.
Todos os dias estou em contacto e falo com muitas pessoas.
Não falo. Escrevo. Escrevo com um dedo em dispositivos que, muitas vezes, acham
que eu quero dizer uma coisa (que não é o que eu quero) e mudam tudo. Escrita
inteligente. Magia negra. Boicote.
Contacto com meio mundo mas na verdade não falo com ninguém.
Conversar cara-a-cara, falar e ouvir fisicamente é coisa rara, antiga. Não há
tempo. Em casa, sozinhos, podemos falar com muita gente ao mesmo tempo,
normalmente sobre inutilidades, e, quando são conversas sérias, tendem a correr
mal, pois ninguém vê ou sente o que dizemos. Só as letras a aparecer. Tem-me
acontecido ser mal interpretada, ver as minhas próprias palavras desvirtuadas
pela minha incompetência na comunicação virtual. Quando quero esclarecer um
assunto, por exemplo, sou chamada de dramática; se explico uma coisa que fiz
sou julgada antes que possa dizer porquê. É a tal coisa de não haver tempo, nem
para explicações, só para suposições.
Complicada esta coisa de comunicar actualmente. Devia haver
cursos, agora que há cursos para todas as coisas, pois de repente deixámos de
saber fazer seja o que for, e temos de ter cursos, formações e mais uma data de
balelas inúteis que nos roubam o tempo todo, e por isso temos de falar com
máquinas, desculpem, através de máquinas.
Pois estes cursos poderiam preparar-nos para os
mal-entendidos. Já há bonecos com expressões que podemos utilizar, mas quando o
caldo se entorna e a discussão de instala, meus amigos, ninguém de lembra dos
bonecos.
Eu sou perita nestas confusões. Preciso de um curso destes
já. Gosto de opinar. E pior que opinar, gosto de esclarecer, o que muita gente
chama de “se justificar”. E já sabemos o que significa quando alguém tem de se
justificar… não é que eu ache que tenha, mas se o outro acha que eu o estou a
fazer… Pronto, está tudo estragado. Quem se justifica tem culpas no cartório,
nisso não há dúvidas.
Nesta era de não ter tempo, nesta teia em que nos enredámos,
de querermos fazer tudo, inclusive aumentar as horas do dia, não fazemos nada,
ou pelo menos, não fazemos nada bem.
Nós queremos ser como as máquinas que usamos. Nós estamos
todos a endoidecer.
Alguém quer conversar comigo com as máquinas desligadas? Bem
me parecia que não.
Um texto tremendamente oportuno! Gostei imenso de o ler. :)
ResponderEliminarObrigada Renata. :)
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