Uma pessoa perde a conta à quantidade de
formas como é controlada. Já é completamente normal que toda a gente saiba o
que estamos a fazer, onde, com quem e durante quanto tempo. Toda a gente sabe o
que gostamos de comer, se temos insónias, se fomos parar ao hospital, se
casámos, divorciámos, traímos ou nos apaixonámos. Tornou-se normal contar a
vida a quem a queira saber, sem vergonha nem filtro, gostamos de mostrar o que
comemos, para onde viajamos, contar as nossas mais íntimas aspirações.
Somos todos cidadãos “livro-aberto”.
Na sociedade “facada-nas-costas”.
Estamos todos a precisar de um psiquiatra.
Habituámo-nos e é viciante. É uma nova forma
de comunicar e sentimo-nos menos sós porque temos respostas. No tempo em que
estamos todos sós falamos através de máquinas. Não falamos coisa nenhuma, mas
iludimo-nos que sim. Sensibilizamo-nos com o interesse dos outros, mas na
verdade os outros só querem mesmo é coscuvilhar a nossa vida. Tudo perdoado. Fazemo-lo
exactamente pelas mesmas razões. Ninguém é inocente.
No meio de tanta informação, tanto
acontecimento, tanta festa, tanto brinde, tanto amor perdido e abandonado nas
redes sociais, há coisas que nos escapam. Habituamo-nos a imagens de fácil
consumo, frases imediatas, competição ao prémio do mais óbvio, e tudo nos
desabitua de pensar.
Há uns tempos o programa informático no meu emprego
mudou. Agora somos diariamente felicitados com uma frase brilhante, uma citação
bonita de gente já quase toda morta. Pela manhã sento-me no meu lugar, ligo o
pc, levo logo com uma imagem maravilhosa de águas calmas e azuis (porque é
Verão), e depois a dita frase. Tudo coisas positivas que não há cá negativismos
no trabalho, excepto claro, o facto de já irmos para lá contrariados e a contar
as horas para fazer o caminho inverso.
Frase lida. Começamos a trabalhar. Embirrei
desde o primeiro dia com as ditas frases. Truques baixos do mundo empresarial
para motivação imediata dos peões. Nada como embirrar com alguma coisa para
começar a reparar com mais atenção. Tomar notas. Rir-me. A lata destes gajos.
E em jeito de conclusão da minha análise das
frases motivacionais tenho a dizer que, somos subtilmente (mais ou menos)
induzidos a entrar no estado de espírito da citação do dia. A dita citação não
é escolhida à toa e detectei uma tendência para, em cada dia da semana, ser
focado um propósito específico. Assim temos:
Segunda-feira: Planeamento;
Terça-feira: Produtividade;
Quarta-feira: Perseverança;
Quinta-feira: Trabalho de Equipa;
Sexta-feira: Felicidade;
Todas as semanas a mesma coisa. Um dia para cada
ponto chave do trabalho exemplar. Sendo que à sexta-feira é-nos permitido ser
felizes. No resto dos dias não há tempo para isso que temos de planear, ser
produtivos e perseverantes em equipa. Para dar o litro. Sempre mais e mais. E
com um sorriso nos lábios.
Eu se calhar era feliz todos os dias se não
reparasse nestas merdas.
:) " Estamos todos a precisar de um psiquiatra." ... yep, estamos mesmo :)
ResponderEliminar(essa das frases é a sério? tão bom!)
É a sério. Mete medo! :)
ResponderEliminarNo meio de tanta "informação", este texto tinha-me passado despercebido. E era uma pena, se o não tivesse visto. Sim, sim, uma pena :) :)
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