Mesmo ao Domingo acorda cedo. Antes das oito
horas sai da cama e liga o computador. Como um aviso. Abre a janela e sente que
o Verão está no fim. Aconchega o casaco e respira a luz do sol, já alto, que
avisa para o tempo que tem de ganhar.
Passa pelo computador e decide pintar as
unhas. Arruma a cadeira junto à secretária e vai escolher a cor do verniz.
Vermelho sangue nas unhas curtas. Pinta as unhas da mão esquerda e lê um livro
para se obrigar a estar quieta, para não estragar já a pintura. Pinta as unhas
da mão direita, mais difícil, a mão esquerda é menos ágil. A unha do indicador,
teimosa, sai sempre mal. Retira o verniz e volta a pintar, retira o verniz e
volta a pintar, retira o verniz e volta a pintar, nunca fica bem, como aqueles
textos teimosos que não saem à primeira a que se segue uma sessão de corta,
escreve, corta, escreve, corta, escreve.
Está há cerca de uma hora a pintar unhas e o
computador à espera. O texto começado, um bocado de nada à espera de direcção,
sempre na sua cabeça, e a unha, teimosa, sempre mal pintada. Irrita-se com a
teimosia da unha e com a sua pouca teimosia por escrever, por deixar o cursor à
espera, por não ter ideias ou ter demasiadas ideias, sem querer bate no frasco
do verniz, que dá uma pirueta no ar lançando rios de vermelho na queda. O chão
e a mesa com riscas de sangue. Não há acetona suficiente para limpar. Não vale
a pena chorar sobre o verniz derramado. Fecha o frasco com o que sobrou e
senta-se a escrever.
adiar a escrita ... percebo bem ou porque não sabemos o que escrever ou porque sabemos bem o que escrever mas não sai como está na nossa cabeça ou porque até sai mas não é bem ou porque ou porque ou porque ou porque
ResponderEliminarPorque é difícil.
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