terça-feira, 28 de julho de 2015

Imaginar


E de repente deixou de estar onde estava. Deixou de ouvir o telefone. Deixou de ver as pilhas de papéis à sua volta. Deixou de ouvir o seu nome, repetido continuamente por diferentes vozes. Foi para a sombra das árvores. Ouvia os pássaros. Sentia uma brisa de final de dia, suave e amiga, que lhe encheu o rosto com o sorriso, e os olhos, mesmo fechados, de brilho.
Ser livre é questão de imaginação. Não o é quem pode. É livre quem luta todos os dias mais um pouco por vir á tona, por escolher respirar fundo em vez de se deixar afogar. Respirar ar puro em locais intoxicados porque se imaginam os dias sem poluição.
A imaginação pode salvar. É uma criação pessoal. E ela sabe disso. Sabe-o quando está só nos dias cheios de gente que não quer ver, e vai para o cimo de um penhasco só para ter o medo bom de cair a flutuar. Devagar. Amortecendo o corpo nas nuvens com formas estranhas que, imaginando, são peixes, cavalos ou até elefantes. E com os pés mesmo na beirinha, continuando com o medo bom da queda, sopra bolas de sabão para os peixes, cavalos e elefantes. Para que fiquem juntos. Ela, que vai dentro das bolas de sabão, e as nuvens que a querem para brincar.
E imagina também, quando à noite está sozinha por dentro e não dorme, quando o luar ilumina uma nesga de chão, imagina uma vida de filme nessa tela de chão. E sorri dos beijos. E sorri dos afagos. E sorri de sorrir gargalhadas. E ser feliz imaginando deixa-a feliz a sério. Salva-a cada minuto mais um pouco. Adia a consciência. Ilude os sentidos. Sorri deitada na cama do bom que é não dormir. Ficar acordada para sentir a felicidade. Imaginada.

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