domingo, 20 de setembro de 2015

Procrastinação


Mesmo ao Domingo acorda cedo. Antes das oito horas sai da cama e liga o computador. Como um aviso. Abre a janela e sente que o Verão está no fim. Aconchega o casaco e respira a luz do sol, já alto, que avisa para o tempo que tem de ganhar.
Passa pelo computador e decide pintar as unhas. Arruma a cadeira junto à secretária e vai escolher a cor do verniz. Vermelho sangue nas unhas curtas. Pinta as unhas da mão esquerda e lê um livro para se obrigar a estar quieta, para não estragar já a pintura. Pinta as unhas da mão direita, mais difícil, a mão esquerda é menos ágil. A unha do indicador, teimosa, sai sempre mal. Retira o verniz e volta a pintar, retira o verniz e volta a pintar, retira o verniz e volta a pintar, nunca fica bem, como aqueles textos teimosos que não saem à primeira a que se segue uma sessão de corta, escreve, corta, escreve, corta, escreve.
Está há cerca de uma hora a pintar unhas e o computador à espera. O texto começado, um bocado de nada à espera de direcção, sempre na sua cabeça, e a unha, teimosa, sempre mal pintada. Irrita-se com a teimosia da unha e com a sua pouca teimosia por escrever, por deixar o cursor à espera, por não ter ideias ou ter demasiadas ideias, sem querer bate no frasco do verniz, que dá uma pirueta no ar lançando rios de vermelho na queda. O chão e a mesa com riscas de sangue. Não há acetona suficiente para limpar. Não vale a pena chorar sobre o verniz derramado. Fecha o frasco com o que sobrou e senta-se a escrever.

2 comentários:

  1. adiar a escrita ... percebo bem ou porque não sabemos o que escrever ou porque sabemos bem o que escrever mas não sai como está na nossa cabeça ou porque até sai mas não é bem ou porque ou porque ou porque ou porque

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